A partir de junho de 2013 o Brasil parou
diante das manifestações iniciada pelo Movimento Passe Livre contra o aumento
da passagem, o movimento ganhou apoio em todo o Brasil, em pouco tempo ruas
estavam sendo tomadas pela população. As manifestações não surgiram do nada,
mas foi fruto da insatisfação do rumo que o país estava tomando, o povo estava
cansado de tanta impunidade , de tanto descaso , estavam cansados de ver a
Educação, a saúde, não ter prioridade. Um movimento iniciado contra o aumento
da passagem tomou outro rumo, em busca de um “Brasil mais justo”.
Estamos em tempos
de ensaio de copa do mundo, com a tal copa das confederações. Muita gente foi
“despejada” (como se gente fosse dejeto mesmo) de suas casas, sob a
justificativa de que novas vias tinham que ser abertas para a tal copa, as
olimpíadas (e a valorização do solo urbano...). E quem vai e volta do trabalho
todo dia em conduções superlotadas, gastando horas extras não remuneradas
nesses trajetos, não vê nenhuma melhora em sua vida depois disso, pelo
contrário. Mas, vê os governos isentando as empresas privadas do setor
rodoviário de impostos e ainda assim aumentando as passagens para garantir
lucros elevados. “Da copa eu abro mão, quero dinheiro pra saúde e educação”,
cantam os/as manifestantes. Tudo isso em época de hipervalorização dos preços
dos imóveis urbanos e dos aluguéis, aumentos generalizados dos custos da
alimentação e de outros gastos essenciais para a manutenção da sobrevivência.
Não há porque estranhar as vaias para Dilma.
Podemos, porém, avaliar que há algo
mais por trás desse rápido despertar das mobilizações de massa. Um caminho para
tanto é localizar quais são os principais alvos das manifestações. Nos
telejornais, especialmente do maior grupo empresarial monopolista das
comunicações no Brasil (a Rede Globo), cujos(as) repórteres tem que se manter
distantes e anônimos(as) para não serem hostilizados(as) pelos(as)
manifestantes, percebe-se enorme dificuldade em manter a linha editorial do
início das manifestações, que as classificava como baderna e vandalismo. Agora
se veem obrigados a baixar o tom e reconhecer o caráter de massa dos
movimentos. Isso porque os monopólios das comunicações são um dos alvos mais
evidentes das manifestações. As pessoas reagem, ainda que de forma
contraditória em alguns momentos, contra
o que percebem ser um instrumento claro de imposição de “consensos” em torno de
valores que lhes são estranhos, quando não hostis, de pacificação dos conflitos
a partir da valorização da repressão e da conformação à ordem dominante.
O outro centro do descontentamento
expresso pelas mobilizações é a repressão policial. Não seria errôneo avaliar
que o rápido crescimento do número de pessoas nas ruas registrado hoje pode ser
atribuído a uma reação contra a violência da polícia – especialmente a paulistana
– na repressão as últimas mobilizações. Atos contra o reajuste das passagens
hoje foram ampliados como atos em defesa do direito de manifestação. Alguns
dizem que a polícia cometeu excessos, outros afirmam que ela é despreparada. Se
equivocam, ou querem confundir. O simples fato de que o Estado brasileiro
manteve polícias militares, mesmo após o fim da ditadura, já deve ser tomado
como fator explicativo para muita coisa. E não é despreparo o que os policiais
demonstram quando atiram a queima roupa em manifestantes – eles foram treinados
para fazer isso todos os dias nas favelas e periferias das grandes cidades (com
a diferença de que lá as balas não são de borracha...). Estão também habituados
a aplicarem essa força repressiva contra todos os movimentos da classe
trabalhadora que ousem ir além do papel de claque dos governantes.
Em suma, os alvos aparentemente
secundários (cada vez mais primários) dos protestos contra os reajustes das
tarifas – os monopólios de mídia em seu esforço incessante por moldar corações
e mentes aos desígnios da ordem do capital e o braço policial/repressivo de um
Estado que nunca abdicou de sua face mais dura, na contrarrevolução permanente
que caracteriza a autocracia burguesa no Brasil (para lembrarmos Florestan
Fernandes) – indicam uma novidade estimulante das manifestações em curso. Elas
prenunciam uma possibilidade de ampliação do dissenso, um clima de levante
latente, contra as duas faces mais fortes, que combinadas trabalham para a
contenção da luta de classes e caracterizam a dominação burguesa na atualidade
brasileira: a imensa rede de aparelhos de criação de consensos e o nunca
desmontado / sempre incrementado, aparato de coerção repressiva.
Marcelo
Badaró Mattos
Professor
da UFF
“Nada está perdido, se tivermos a coragem de proclamar que tudo está
perdido e que devemos começar de novo.” Julio Cortázar (1914-1984), escritor argentino.
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